segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

A LUA BÓIA SOLITÁRIA








A lua bóia solitária num céu claro de verão
Mas ilumina a humanidade na noite dessas horas
Tudo está entrelaçado nesse cosmo e há razão de ser
Essa lua viva e esse sol que há em ti traz luz e vida
Teus lamentos ao chão fazem brotar flores pelo caminho
Crescem árvores, folhas, flores e frutos no teu silêncio
É um trabalho de formiguinha, de abelha fazendo mel
Teu blues te transformou em alguém melhor maior
Deixa a lembrança embalar confortavelmente os dias
Apinha o que ficou de melhor e ergue um altar à altura
Sela historicamente esse amor que foi será pra sempre
Constrói um castelo de pedra com o que ficou de tátil
Uma estátua de bronze desse grande amor jamais volátil


TRÂNSITO: O ESTRESSE URBANO


Por Alexandre Câmara

Ainda bem que me mudei para Rio Largo. Apesar de morar em Maceió, no Trapiche da Barra, ouvindo o barulho do mar, nunca me enganei. Sempre estive muito pertinho do caos. Hoje tenho paz de espírito porque o que mais me enlouquecia era esse trânsito que me fazia sentir impotente, estúpido, enganado pelo sistema, uma peça sem valor, um número de identidade.

Maceió não é mais a mesma. Já vai longe o tempo em que a Ponta Verde não tinha sinal de trânsito, que a Pajuçara não engarrafava e que trânsito no Farol era só até o viaduto do antigo CEPA. Hoje, um dos maiores motivos de estresse e do mau humor na cidade de Maceió são os engarrafamentos por qualquer região da cidade por onde se trafegue.

Atualmente só entram nos claustrofóbicos engarrafamentos do trânsito do Centro os desavisados, os esquecidos e os que não têm escapatória. Por onde quer que se entre ou se saia, a palavra de ordem é esperar, esperar e esperar. Detalhe: sob o sol escaldante, todo suado dentro do carro, sempre à espreita da sirene neurótica do SAMU. E quando ele passa, ache um lugar para enfiar o carro!!! Antes fosse a musiquinha do gás. Cidadania é educação. Silêncio para os doentes. Barulho é estratégia de guerra.

Se o cara pegar um ônibus para Rio Largo, por exemplo, às 16h30 nos Martírios, via Fernandes Lima, se houver algum transtorno como acidente, só vai chegar no Centro de Rio Largo por volta de 18h30, o que parece insano considerando que o percurso é de 28 Km, que pode ser feito em cerca de 30 minutos. Os contornos de quadra do Farol conseguiram dar uma aliviada na mórbida velocidade dos autos em direção ao Tabuleiro. Mas com as facilidades oferecidas à população para a compra de automóveis talvez já tenha inviabilizado a parca melhora do desenvolvimento do trânsito em direção ao Tabuleiro.

Do centro para o Benedito Bentes via Jacintinho-Barro Duro então..., amargue horas para chegar. Ali um dos principais gargalos é exatamente o Jacintinho, onde autos, ciclistas ousados, caminhões de feira, feirantes nas esquinas e transeuntes que enfrentam corajosamente os carros se confundem. Para ultrapassar o Barro Duro é outra novela. Uma novela lenta e enfadonha que os espectadores são obrigados a ficar ligados.

Na hora do rush evite subir pela Cambona; é angustiante, abafado, praticamente não se sai do lugar até se chegar no sinal que bifurca a ladeira do mirante de Bebedouro com a entrada da Chã da Jaqueira - voltar é mais tranqüilo. Aliás, descer do Tabuleiro para o Centro pela Cambona é uma experiência legal: a lagoa Mundaú, o por do sol, a ventania entrando pelo carro nas imediações de Santa Amélia. Bem gostoso.

O sonho do inconsciente coletivo de felicidade não pode existir nos centros urbanos se você não anda de helicóptero. E mesmo nesse caso, os problemas são outros: seqüestros, preocupações com segurança por causa da violência, etc. Eu quero mais é alimentar minhas pequenas riquezas. Ter tempo para sentir o cheiro de terra emanando do quintal em dia de chuva. Ouvir a sinfonia de cigarras quando o dia amanhece. Ter ventania de uma janela a outra passando pelo meu café da manhã. Iniciar o dia preso no trânsito para chegar no trabalho que paga pouco e oferece um futuro pessimista é coisa de doido. E depois, o doido sou eu.

Então ficamos assim


Então ficamos assim

Depois de aflorar tudo novamente e mim

Você vem estraga tudo no fim

Os últimos homens...


Os últimos homens que encontrei

São muito diferentes dos que amei

Ou a inocência em mim morreu

Ou o brilho dos meus olhos feneceu


A BETHANIA LIVRE DE CORPO E ALMA







NADA TENHO A DAR


Nada tenho a dar
Mas se esse nada você me cobrar
Tudo vou lhe recusar
Jogar na sua cara
A importância do jejuar

QUERERIA SER GENET


Quereria ser Genet, Ginsberg
Na construção do amor absurdo
Jamais abrirei mão da dignidade
Ninguém vai me humilhar
Talvez seja um tipo genético de sanidade
Se me diminuir, me destruir
Vai perder tudo

ANGELA RORO FOI A PRIMEIRA CANTORA DE MPB A SAIR DO ARMÁRIO








Conheci Ângela RoRo ainda na adolescência. Ficava com a capa do seu primeiro disco na mão olhando para aquela beleza selvagem. De cara, achei um disco com algumas músicas boas outras chatas. Mas cada vez que ouvia, descobria uma letra linda, uma entonação perfeita, me acostumava com as harmonias menos populares, mais difíceis aos ouvidos.

Fiquei fã incondicional ao ler suas matérias. Primeira artista assumidamente homossexual da MPB. Podia esconder isso pra vender discos pros mais caretas mas não o fez. Como ela é compositora, letrista, ao escrever a música Tola Foi Você, não tinha como negar que havia sido feita para uma mulher. Pioneira, fez escola para Cassia Eller e Anna Carolina.

Inteligente, livre de qualquer preconceito, libertária, canta amores e desamores, a boemia e o desregramento, o amor desmedido mas também contextualiza seus versos a favor da paz e do amor. Foi a minha bíblia durante muitos anos. Prestava muito atenção no que ela dizia.

Fiquei muito triste quando em seu hiato profissional porque ela nos privou de sua louca lucidez e de muitos e muitos discos e sucessos que poderiam ter sido feitos mas não foram. Meio que órfão. Mas esse é o grande barato da vida: não ter que ser escravo nem mesmo da arte. Bom para ela que parou de beber e se drogar. Mas para ela; as únicas coisas que achava ruim nisso é que ela não se preocupava em divulgar seus discos.

Quando ela surgiu, era muito bonita. Uma das belezas mais estonteantes que já presenciei. Ficava pensando como ela podia deixar-se engordar muito; mas é que mesmo gorda ela ainda era muito bonita.

Lembro que a entrevistei aqui em Maceió há muitos anos atrás e ela já estava gorda. Mas sempre uma presença imponente. Quando ela surgiu no teatro para a coletiva já dissemos logo: É Ela!!! Alta, toda de branco.

Fui ao show do seu segundo disco, o Só nos Resta Viver. Nossa, que escândalo!!! Um blazer branco sobre um macacão preto ligadinho no corpo sem sutiã e uma bota branca. Cabelos grandes, e aquele sorriso lindo... Nossa, quando a luz refletiu seus olhos verdes e ela entrou fazendo com as duas mãos o "V" - símbolo hippie de paz e amor... era a imagem da perfeição!

Bonita, inteligente, louca, sincera, escrachada, debochada, sem papas na língua, foi ícone de uma geração que viu em sua postura a possibilidade também de se soltar e de dizer ao mundo: eu sou mais eu!